sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Um Poema à moda de Alberto Caeiro


Ao olhar dos poetas é vida,
Amor, ao entardecer...
Ao olhar dos cientistas é luz, fogo...
Eu... Eu chamo-lhe Sol.

É a luz que me ilumina,
É o fogo que me aquece,
É a vida que me sustenta
E é o amor... Que eu não conheço,
Que não sei explicar, que não quero pensar,
Apenas sentir...
Eu gosto do que sinto quando o olho,
Quando ele me aquece...
Quando me ilumina...
Gosto dele. Porquê?
Não sei. É o meu Sol,
Sol que não conheço, que não toco,
Que não cheiro... Mas vejo-o
E sinto-o com os olhos, em mim,
Como se fosse parte de mim
Apenas por senti-lo...

Porquê Sol e não luz, ou fogo, ou amor?
Se assim pudesse ser, então não era Sol...
O amor é amor, a vida é vida e o Sol é Sol.

E tal como o Sol é o Sol,
O que sinto é um sentimento
E é inexplicável...
Se o explicasse não era um sentimento,
Era um pensamento...
E eu não quero pensar,
Porque quem pensa não sabe sentir
E eu sinto...
Sinto o Sol.

Fernando Pessoa, A Dor de Pensar

'Não há felicidade senão com conhecimento. Mas o conhecimento da felicidade é infeliz, porque conhecer-se feliz é conhecer-se passando pela felicidade, e tendo, logo já, que deixá-la atrás. Saber é matar, na felicidade como em tudo. Não saber, porém, é não existir.'
FERNANDO PESSOA, O Livro Do Desassossego de Bernardo Soares


Uma das temáticas de Fernando Pessoa é a dor de pensar. Esta temática esclarece o sofrimento de Pessoa quando racionaliza e consciencializa a realidade.
O seu desejo de ser inconsciente (para poder ser feliz) possuindo a consciência de que é inconsciente (sem se tornar infeliz) é um dos grandes desejos de Pessoa patentes nesta afirmação. O poeta acredita que apenas somos felizes quando somos inconscientes, como quando sonhamos, mas esse sentimento apenas permanece em nós se não tomarmos consciência de que ele existe, como afirma o poeta na frase acima 'O conhecimento da felicidade é infeliz (...) tendo, logo já, que deixá-la atrás'.
Pessoa receia a infelicidade por ser consciente, receia a dor de pensar.
O poema 'A Ceifeira' retrata bem o desejo de inconsciência de Pessoa. Toda a simples vida da ceifeira e o seu canto alegre, tendo ela a mísera vida do campo e do luto, são invejados pelo poeta. Ele deseja ser como ela, ser feliz ainda que não saiba que o é, sem ter a consciência que lhe rouba a felicidade.
Assim, sendo o ser humano obrigado a ser lúcido (é-o por natureza), Fernando Pessoa sente-se condenado a sê-lo também, a pensar e a ser, consequentemente, infeliz.